quinta-feira, 2 de julho de 2009

Quartelada latino-americana


Para aqueles que esperavam não mais presenciar quarteladas na América Latina o golpe militar desencadeado domingo último em Honduras, que depôs José Manuel Zelaya Rosales eleito democraticamente nas urnas, fez-nos reviver os horrores vividos em grande parte dos países da América Latina durante o século passado.

A fórmula é bem conhecida: um grupo de cerca de 200 militares encapuzados e fortemente armados invadiu no último domingo, 28 de julho ao amanhecer do dia, a residência oficial do presidente metralhando portas, arrancaram-no da cama de pijama e o deportaram para Costa Rica, como relatou Zelaya no exílio para a CNN Chile.

Membro da classe economicamente dominante, filho de latifundiários pecuaristas e do setor madeireiro, Zelaya foi eleito em 2005 pelo Partido Liberal com um programa que priorizava a segurança e um conjunto de ações educativas para reintegrar os jovens das inúmeras gangues das cidades hondurenhas em oposição a proposta de pena de morte defendida por seu oponente.

Desde sua posse Zelaya afastou-se de seu partido e de suas bases no Congresso aproximando-se dos Sindicatos e do movimento indígena ganhando simpatia com sua política de aumento do salário mínimo em mais de 60% durante seu mandato. Em seu governo Honduras aderiu à ALBA – Aliança Bolivariana para as Américas – o que causou no empresariado o medo de que Zelaya realizasse nacionalizações.

O estopim para o golpe foi a proposta de realização de um referendo popular, marcado para o dia do golpe, onde os hondurenhos iriam optar pela inclusão de uma urna nas próximas eleições de novembro para a eleição de uma Constituinte. Embora o referendo tenha sido marcado a partir da coleta de mais de 400 mil assinaturas como exige a Constituição, o Congresso, o comando do exército e a Corte Suprema posicionaram-se contra.

O novo no episódio é a posição assumida pelos Estados Unidos que, de sua histórica postura de artífice e apoador de golpes de estado manteve-se desde a fase das articulações contra a ação golpista. Em entrevista dada ao jornal El Pais dois dias antes do golpe, Zelaya, que havia destituído o Comandante do Exército por boicote ao plebiscito já denunciava as articulações da classe dominante e do alto comando das forças armadas para a realização do golpe e afirmava que só se mantinha no poder graças ao apoio dos EUA. É importante lembrar que Honduras na década de 80 foi, graças ao treinamento e financiamento americano, a principal base contra revolucionária na luta contra o Sandinismo na Nicarágua.

O Congresso fez ler uma falsa carta renúncia de Zelaya e empossou como interino o presidente da casa, Roberto Micheletti que para conter os protestos populares decretou toque de recolher e suspensão das garantias constitucionais.

O Episódio nos faz lembrar o fracassado golpe contra Hugo Chaves em 2002 magistralmente registrado pelos cineastas Kim Bartley e Donnacha O'Briain no documentário A Revolução não será televisionada. Na época a população Venezuelana tomou as ruas e forçou os golpistas a restituírem o poder usurpado a quem de direito o havia conquistado nas urnas.

Sinal dos novos tempos, a OEA, a ONU e muitos chefes de estado, e dentre este Lula, tem feito coro aos Estados Unidos na condenação da aventura golpista, exigindo a volta imediata ao estado de direito e a devolução do cargo a Zelaya.

Que vença a democracia e o sonho sobre o medo e a truculência antidemocrática.